quarta-feira, 23 de abril de 2008

EM FACE DO POEMA

EM FACE DO POEMA

O poema é errático
em sua busca de trilhas

O poema é herético
em seu derrubar de cânones

O poema é réptil
em seu rastejar na lama

O poema é erétil
ao festejar a libido

O poema é erótico
quando se joga na cama

O poema é elíptico
ao traçar sua trajetória
ao desenhar sua história.

Quando se entrega ao vício
do ofício
O poeta é manancial
é um cipoal de palavras
entre urbes, entre urzes.

Entre sombras e luzes
o poeta é barroco
e meio louco
é do tudo um pouco.

A poesia urge
e o poeta ruge.

sábado, 19 de abril de 2008

TRANSITÓRIA PERMANÊNCIA

Sou poeta. E por ser poeta canto
a leveza do fardo,
a beleza do cardo
do mar
do fogo-fátuo
que exala formas no ar.

E canto enquanto vivo.
Canto a beleza do instante
mutante,
inconstante,
do incessante vir a ser.
Canto o transitório
e o transe dos amantes
lapidados diamantes:
canto os laços desfeitos
e os liames que virão.

Não gozo gozos aflitos
nem sofro horrores.
Sou calmo. Sorvo pranas,
sou zen, sou sem destino
no mundo.

Por isto tudo é que canto.
A canção é para mim,
para ti, para nós,
canção sem fim.
Canto canções
da transitória permanência,
essências de vertigens
e caminho contigo rumo ao novo,
ao velho, ao novo
romper do ovo,
buscando transcendências
e inconfidências
contidas em corpos e almas
para confundir as mentes.

Por isso, canto. A beleza do verso,
a fúria do verso,
a flor do cume e o lírio do lodo,
o tudo e o todo,
o inútil e o passageiro.
Amanhã, na manhã, posso ser nada,
Posso ser nódoa que fica
na folha de papel.
Mas não importa. Enquanto eu vivo,
canto,
e teimo em buscar o céu.

Brasília(DF), 19 de abril de 2008.


sobre a obra

Poema inspirado pela obra magnífica da grande Cecilia Meireles, poeta modernista que cantou o efêmero e o transitório da existência e do também grande poeta Walt Whitman, americano, romântico moderno, naturalista e telúrico, que cantou a grandeza e a beleza das relações humanas, do homem na natureza e da benesse divina da vida humana, em sua plenitude como criaturas

sábado, 12 de abril de 2008

ÀS POMBAS

ÀS POMBAS
Na madrugada sanguínea
e avermelhada
por bombas e mentes
dementes
voam bandos de pombas,
em revoadas
fugidas de pombais
inexistentes.
As pombas da paz revoam
ares revoltos
farfalhando barulhos e arrulhos
nos frios de julho.

A paz, que a bomba transforma em pós,
jaz aos pés
é pus,
é nada,
é nódoa,
na manhã desta doce madrugada
acinzentada.

Assim como os sonhos,
enclausurados,
antes, nem sonhados,
além de abrigos
blindados,
não encontram guarida em corações
emparedados, empedrados,
também a pomba, bamba de terror
ante a bomba que a desfaz
em sinfonia de medo
no sangue e cor em que jaz
ao pombal, não voltará
Não voltará. Jamais.

sobre a obra:
um poema parafraseando Raimundo Correia ( de quem sou leitor assíduo), uma releitura das pombas(bombas) da paz, que sobrevoam e explodem em nossas cidades. As pombas aos pombais, e a paz? Nos jornais?

ESTA BOCA QUE TE AFAGA

O homem, lobo do homem,
fera entre feras,
perdido nas estrelas,
embriagado entre vãs atmosferas
não sabe se beija ou se morde
a boca que o afaga
não sabe se é carinho ou vício
a mão que o esmaga.

Nem de si o homem sabe, perdido
entre seus iguais.
E o peso de constelações
de constatações
e de contrições siderais
o aniquila
sem que possa ao menos
a pulmões plenos
gritar sua dor
em uivos primais.

O homem, lobo do homem,
Narciso, ego,
nega, nega
sua vã filosofia:
E se acredita mágico,
lírico cântico
como lírios brancos
ao cair da tarde
mas arde: de volúpia,
de gula animal
desejos irracionais que o arrastam
à lama, que renega.

Esta mão que te amordaça,
esta boca que te afaga
é o peso que te esmaga
é a força que te cala
que te encerra nesta cela
que tu próprio és.

sem quimeras, sem quereres,
sem ilusões de grandeza.
busca, na paz da poesia,
entender tua triste condição:
ser humano que és, pleno
de penas e contradição:
A Busca, amigo, nesta viagem,
que é miragem,
de um caminho
De libertação.

Brasilia( DF), 12/04/2008